Texto parcial de matéria de Nathália Geraldo, publicada originalmente no Universa │UOL em 01/02/2022
Se viva, Lélia Gonzalez, uma das maiores intelectuais do Brasil e pensadora referência em temas de raça e gênero completaria 87 anos nesta terça-feira (1º). Sobrinha da pensadora mineira, Eliane de Almeida, a yalorixá Lili de Oyá, hoje com 73 anos, é uma das partes da família de Lélia à frente do projeto Lélia Gonzalez Vive, que promove ações para manter e divulgar o legado da autora, que acumulou formações em antropologia, história e filosofia e faleceu em 1994, vítima de um infarto.
“Carrego até hoje a lembrança de quando minha mãe fez um vestido do baile de formatura para Lélia, que terminava o científico. Era da cor azul. Quando a vi, perguntei: ‘Mamãe, fada negra existe?'”, recorda Lili. Como muitas mulheres negras, ela se inspira, revisita e admira o passado da tia. “Morei com ela ao final da vida, e estive em muitas reuniões que ela fazia com aquela mulherada para falar as coisas que não eram da academia. Ela falava o ‘pretuguês’, como dizia”.
O que a ativista, que fez parte do grupo de fundadores do Movimento Negro Unificado – MNU, dizia sobre gênero, raça, classe e até mesmo como se vestia passavam uma mensagem.
Analisar as identidades brasileiras e denunciar os estereótipos e como o racismo se entranhava na sociedade era sua especialidade. Tudo feito com linguagem fácil e, por vezes, debochada.
“Ela queria atingir a população sobre a qual ela estava falando; ou seja, de uma pessoa que se reconhecia negra e que fala para pessoas negras”, comenta a pesquisadora em história, gênero e raça na Universidade Federal do ABC (UFABC), Isabela Sena.
“Em seus textos, há várias camadas, de teoria cultural, história do Brasil, psicanálise, marxismo. Ela usava tudo para explicar as relações sociais do país, e em um período em que terminava a ditadura”.
Estudada e com uma vida à frente do seu tempo
Uma das vozes mais conhecidas dos movimentos feministas e negros, Lélia Gonzalez estava “à frente do seu tempo”, avalia Lili.
“Lélia agia, falava de forma diferente. Até porque foi a única que estudou efetivamente na família; minha mãe, por exemplo, só foi até o ensino primário. Então, ela ia às coisas profundamente”, diz. “Até mesmo na moda, ela fazia umas misturas, de estampas, o que era maravilhoso para mim. Fico pensando que ela era corajosa, porque vejo mulheres negras usando hoje o que ela já colocava há 30 anos”.
Para a neta da pensadora, Melina Lima, que também faz parte do projeto Lélia Gonzalez Vive, o estilo que ela seguia não era meramente uma escolha de moda.
“Quando minha avó tomou consciência da importância da valorização da cultura negra, passou a se aproximar da estética afro. Buscou suas raízes, parou de usar perucas, virou símbolo de luta e resistência, num momento que a estética do ‘branco-europeu’ era visto como bonita e superior. Isso foi no fim dos anos 60, início dos 70. Ela fez viagens para África depois, que só reforçaram o orgulho dessa cultura, que é nossa também”.
No campo intelectual, a ousadia e os novos caminhos que se propunha a traçar fez de Lélia uma pensadora pioneira na articulação de questões de gênero e raça. “Ao apontar o racismo, o sexismo e como eles se interligam, a pensadora se torna pioneira na visão da interseccionalidade. Por isso, quando, nós, mulheres negras, lemos Lélia conseguimos ver que ela coloca em palavras o que a gente sente. E, às vezes, o que a gente fala e não tem ninguém para ouvir”, afirma Isabela, que também faz parte do Bibliopreta, projeto de divulgação do conhecimento negro.
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Para ler na íntegra, acesse: https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2022/02/01/lelia-gonzalez-como-pensadora-negra-marcou-militancia-tambem-pela-estetica.htm
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Quer saber mais sobre Lélia Gonzalez? Conheça sua biografia publicada pela Selo negro Edições:
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LÉLIA GONZALEZ
Retratos do Brasil Negro
Autores: Alex Ratts, Flavia Rios
Obra que versa sobre a trajetória de vida, a produção intelectual e o ativismo político de uma das maiores lideranças do movimento negro brasileiro do século XX. Através da biografia de Gonzalez, os autores deixam entrever o processo de abertura democrática, revelando ainda a construção de identidade coletiva de segmentos excluídos da política nacional, notadamente os negros e as mulheres.Esta obra faz parte da Coleção Retratos do Brasil Negro, coordenada por Vera Lúcia Benedito, mestre e doutora em Sociologia/Estudos Urbanos pela Michigan State University (EUA) e pesquisadora e consultora da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo. O objetivo da Coleção é abordar a vida e a obra de figuras fundamentais da cultura, da política e da militância negra.