Texto parcial de matéria de Paula Felix Palma feita para o UOL TAB e publicada em 11/07/2020.
Marchas supremacistas. Agressões no seio das famílias, nas ruas, nas redes sociais. A violência simbólica das relações de trabalho, amorosas e familiares, em palavras e pequenos gestos. O rancor pelo outro e o desrespeito à vida, alimentado pelo Estado. Vivemos em um mundo em pedaços, em tempos de conflitos extremos. O ódio disputa nossa atenção e energia — é preciso subverter essa ordem e alimentar em nós a empatia.
O que o discurso de ódio esconde? Por trás dele há um grito de desespero pelo descuido com algo não negociável na vida das pessoas. A chave é entender que atos de violência, exclusão e repressão não atendem satisfatoriamente a esses anseios.
“Se queremos que as pessoas abram mão de atos que machucam e que violam, isso deve ocorrer não por um processo de educação forçada — que é outra dinâmica autoritária para contrapor a que está em curso —, mas porque a pessoa enxerga que o ato de violência não vai cuidar do que ela quer que seja cuidado.” A constatação é do pesquisador britânico Dominic Barter, apoiador de diversos movimentos que visam a construir sistemas sociais dialógicos ao redor do mundo, principalmente no Brasil, baseados na Comunicação Não-Violenta.
“Sem abarcar a diferença e o consenso, não é possível manter o pacto social e aumentam o grau de violência física e o desespero perante a situação de mal-estar e de toda a desigualdade de poder”, diz ele. Barter mora no Brasil há 28 anos e começou a subir os morros do Rio de Janeiro porque não se conformava com a realidade do país que o encantou ainda na juventude.
Sistemas sociais dialógicos
Barter esteve em contato, por 18 anos, com Marshall Rosenberg, psicólogo estadunidense que sistematizou a Comunicação Não-Violenta. Filho de imigrantes judeus que fugiram do Holocausto, Rosenberg conviveu com diversos tipos de violência na sua infância em um bairro segregado de Detroit. “Foi nos movimentos dos direitos civis nos EUA, no movimento feminista dos anos 1960 e 1970, da sua convivência com gangues e com jovens infratores marginalizados que ele foi descobrir como as pessoas, nas piores circunstâncias, não somente sobrevivem, mas subvertem a realidade a partir de uma outra lógica”, conta ele ao TAB.
Ao investigar de onde vem a comunicação que produz violência, Rosenberg citava o estudo de um teólogo cristão, Walter Wink. No livro “The Powers That Be” (“A existência dos poderes”), ele rastreia 8.000 anos de uma lógica de dominação que criou uma linguagem de classificações e julgamentos, com punição e recompensa. Essa constatação demonstra como o desafio do fim da violência e dos diálogos harmoniosos vai muito além de “técnicas” para melhorar relações.
Junto a diversos jovens dos morros do Rio de Janeiro, Dominic Barter foi precursor dos Círculos Restaurativos, técnica de resolução de conflito cuja abordagem teve início há 25 anos e se tornou a primeira prática restaurativa implementada pelo Ministério de Justiça no Brasil. Seja na comunidade, no tribunal ou na escola, as pessoas impactadas por danos ou violência se juntam para dialogar e construir um plano factível de reparação. Outro sistema social dialógico que ajudou a lançar foi o Espaço Beta, em que jovens administram seu próprio processo de aprendizagem.
Necessidades que humanizam
“Se eu conseguir entender que, mesmo no conflito, estamos em busca de atender às mesmas necessidades, é mais fácil assumir uma postura de curiosidade sobre o que o outro está pensando e vivendo”, afirma ao TAB a especialista em Comunicação Não-Violenta e mediadora de conflito, Carolina Nalon.
E do que as pessoas precisam? Justiça, segurança, ordem, inclusão, pertencimento, amor etc. Cidadãos de diversas classes, países, partidos ou posições sociais se encontram nas mesmas buscas. “Há algo de muito profundo que nos aproxima”, diz Barter.
A quebra de paradigma da Comunicação Não-Violenta deriva de uma conhecida frase de Marshall Rosenberg: “Toda violência é expressão trágica de uma necessidade não atendida”. Nunca fomos ensinados a pensar em termos de necessidade. Em vez de dizer “eu me sinto assim porque eu preciso…”, costuma-se atribuir ao outro a culpa por um sentimento ruim ou desconforto.
Expressar anseios e necessidades de forma indireta, por meio do uso de avaliações, interpretações e imagens, faz com que o outro enxergue nisso uma crítica. E, nesse caso, ele tende a investir sua energia na autodefesa ou no contra-ataque.
E a violência externa é resultado de outra, interna. A escritora, psicanalista e educadora parental Elisama Santos, autora do livro “Por que gritamos?”, explica que o grito vem de algum limite que se está ultrapassando. “Há uma necessidade latente, inaudita dentro de nós, que se expressa em forma de grito. Há algo dentro da vida que não está sendo visto e nem cuidado.”
Para ler na íntegra, acesse: https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2020/07/11/cotidiano-bruto-esta-nas-palavras-o-que-propoe-a-comunicacao-nao-violenta.htm
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COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA
Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais
Autor: Marshall B. Rosenberg
EDITORA ÁGORA
Manual prático e didático que apresenta metodologia criada pelo autor, voltada para aprimorar os relacionamentos interpessoais e diminuir a violência no mundo. Aplicável em centenas de situações que exigem clareza na comunicação: em fábricas, escolas, comunidades carentes e até em graves conflitos políticos.