Meu caso com o gim começou graças a Luís Buñuel. Quando escrevi um romance sobre a geração que foi jovem no final dos anos 60/começo dos 70, “O Fantasma de Luís Buñuel”, reli suas memórias e a descrição que ele faz do gim antes de dar sua receita do dry martini que me conquistou. Para ele, o gim era o companheiro ideal para a imaginação. “Por quê?” – pergunta-se. “Não tenho ideia. Mas constato isso.”
O que também, prazerosamente, passei a constatar. E o dry martini virou o rei dos drinques aqui de casa.
De vez em quando, topo um Negroni – também à base de gim –- oferecido pelo meu bartender preferido ou, saindo do gim com certo esforço, um Sazerac. Quando convidada, aceito também com muito gosto o imbatível gim-tônica da querida amiga e historiadora, Zilda Yokoy, que acrescenta alguns bagos verde-azulados de zimbro à deliciosa mistura que delicadamente coloca em nossos copos.
Tendo escolhido o gim como bebida preferida, achava que saber que ele é feito de zimbro me bastava. De fato, basta, ou nem isso é preciso saber para apreciar o líquido translúcido e sutilmente cremoso cuja beleza, por si só, é uma atração estética adicionada à sua graça. No entanto, saber mais sobre algo que amamos não deixa de ser uma alegria; descobrir suas perfeições e intimidade só enriquece a experiência de desfrutá-lo.
Foi o que confirmei ao ler o livro recém-publicado pela editora Mescla, “Os segredos do gim”, de José Osvaldo Albano do Amarante, de cuja sapiência etílica ninguém pode duvidar. Assim fiquei sabendo que o gim não é inglês, como humildemente eu pensava, e sim uma invenção holandesa do século XVII, feito a partir de um destilado alcoólico básico de cereais como cevada, trigo, milho, centeio, e também – o que me pareceu estranhamente modernoso – uva, cana-de-açúcar e maçã. Só depois é que entram os inapreensíveis botânicos, a alma do gim: uma mistura de especiarias, ervas, flores e frutas, que tem como ingrediente predominante o inigualável zimbro, sem o qual o gim não é gim. É justamente nessa combinação que reside o maior segredo de cada produtor – há, inclusive, os que o mantêm a sete chaves.
O Tankeray London Dry Gin – feito com álcool de grão de trigo, e quatro destilações (não me pergunte por que, pois como o mestre Buñuel, não tenho ideia) – recebe a infusão de uma receita secreta da qual o produtor só divulga quatros ingredientes: bagos de zimbro, sementes de coentro, raiz de angélica e de alcaçuz. É meu preferido, mas penso talvez abandoná-lo agora que soube que o gim mais perfeito para um dry martini, segundo os principais bartenders do mundo, é seu irmão, o Tanqueray No.Ten Gin que, entre outras sutilezas, recebe uma pitada de flores de camomila. Não é demais?
Conhecer os botânicos do gim é a delícia extra que este livro nos traz. Dá vontade de conhecer alguns só pelo inusitado de sua mistura, como o que leva olho-de-dragão chinês, sementes de papoula branca turca e folhas de lótus chinesas; ou o que leva yuzu (fruta asiática híbrida) e açafrão.
Nas minhas próximas viagens levarei uma lista dos mais apaixonantes. E também daqueles dos quais quero distância, como um que leva pepino holandês, e outro que leva resina de franquincenso (resina aromática usada no incenso). Ou, pensando bem, talvez os experimente: até para o gim é preciso ter a mente aberta. Pois não é que me deu vontade de experimentar o brasileiro Arapuru London Dry Gin que leva em sua infusão de botânicos, fatias de caju desidratado, sementes de pacová, sementes de puxuri, e fruto seco de imbiriba?
Acho que farei meu próximo dry martini com esse.
Obrigado, Amarante!
PS: A quem interessar possa. A receita do dry martini do Buñuel é muito parecida com a inventada por Sir Winston Churchill, e que está no livro do Amarante. Basta adicionar sobre o gelo algumas gotas de Noilly Pratt e 4 gotas de angustura, mexer, e esvaziar o copo. O gelo conserva os vestígios sutis dos dois aromas, e sobre ele derrama-se o gim puro. Mexe-se um pouco et voilá! O melhor dry do mundo.
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Artigo publicado no Blog de Maria José Silveira, em 24/11/2016. Para acessar na íntegra: http://www.invencoesverdadeiras.com.br/2016/11/24/a-paixao-pelo-gim/
Conheça o livro:
OS SEGREDOS DO GIM
Autor: José Osvaldo Albano do Amarante
MESCLA EDITORIAL
Única obra brasileira do gênero, Os segredos do gim inova em todos os aspectos. Do projeto gráfico arrojado às formas de consumo, passando pela história do surgimento da bebida, o livro aborda a legislação brasileira e europeia que regulamenta a produção da bebida, as principais ervas aromáticas utilizadas no preparo, o processo de destilação, os grandes líderes mundiais na fabricação do gim, as principais marcas brasileiras e, claro, os coquetéis mais consumidos – e os mais exóticos. Totalmente ilustrado, traz ainda os melhores bares de gim no Brasil e no mundo.
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